Crônica S/A – O boteco virtual

Vicente Sá

Não sei onde foi que eu ouvi que a necessidade era a mãe de todas as coisas. Gostei da frase, achei otimista e um necessário incentivo no sentido da criação de saídas, novas formas de olhar à volta e, também, de resolver situações problemáticas. Algo, assim, feito a inteligência carinhosa da vida que navegamos. E, como navegar é preciso, conto este causo/encontro que tivemos durante a semana.
Os primeiros a me ligar foram o Profeta e My Teatcher. Reclamavam de que estava doloroso – eles dois usaram esta mesma palavra – viver assim, sem poder conversar em um boteco.

  • E já se passaram três imensos meses, urrou My Teatcher. Fala com tia Walkiria, humilhou-se.
    O caso era grave, mas antes que eu criasse coragem, tia Walkiria ligou.
  • Vamos fazer uma live butecal. Já falei com o Chicão e ele vai ser o nosso garçom. Se prepare, avise à Lúcia e fique esperando. Será às oito da noite de hoje. Usaremos a Zoom especial que eu criei.
    Pouco antes das oito, lá estava eu, sentando em frente ao computador, com um isopor do lado com algumas latinhas e uma garrafa da danada, oferta de Sérgio Duboc. Tava meio sem graça por ter recebido muitos agradecimentos dos amigos por uma coisa que não fizera. Afinal, tia Walkiria nem deixara que eu ligasse para ela.
    Mas agrado e cafuné, quem é que não quer?
    Oito em ponto, minha tela do computador se iluminou e pude ver seis quadrados em torno de um maior no centro, este mostrando uma mesa repleta de tira-gostos das mais variadas formas e sabores, de sarapatel a empadinha, passando pelo salaminho, ovo de codorna, ovo colorido, língua, torresmo, galopé, caldo de mocotó, dobradinha, linguiça, pastel, frango a passarinho, camarão no espeto… até tripa frita tinha.
    Nos quadrados menores, surgiram as imagens de tia Walkiria, o Filósofo da asa Norte, My Teacher, Profeta, o Rei da Asa Norte e eu. Soou um gongo e tia Walkiria falou:
  • Pela gravidade da situação, eu resolvi usar um pouco de magia tecnológica e, com ajuda do Chicão, abrimos este boteco virtual. Durante quatro horas vamos poder conversar, beber, fumar o quanto e o que quiser, e o Chicão vai nos trazer bebidas, pode pedir qualquer coisa que ele vai trazer, e tem esta mesa de tira-gostos que será sempre renovada por ele. Se algum de vocês tiver, tolamente, trazido um isopor com cerveja deixe aí de lado, será desnecessário.
    Eu comecei a me explicar, mas os pedidos pipocaram: Um hifi, uma caipirinha, uma vodca, cerveja… e surgia o Chicão, que colocava as bebidas no pequeno espaço da mesa, que ele mantivera vazio. Nós esticávamos as mãos e pegávamos as bebidas e os tira-gostos de dentro da tela e trazíamos para fora. Meu chope estava bem tirado e supergelado.
    Animados, conversamos sem ver o tempo passar, até a hora em que soou outro gongo e tia Walkiria avisou que era a hora da saideira e da conta.
    Enquanto bebíamos a saideira, Chicão apareceu junto à mesa e disse o valor, que tia Walkiria dividiu pelo tipo e quantidade de bebida que cada um tinha tomado e deu os valores para cada um, avisando:
  • Não estão incluídos os dez por cento, deixem o que vocês acharem que devem deixar em cima dos teclados.
    Perguntei se podíamos pagar em dinheiro virtual, mas ela nem riu da piada e, assim, me despedi dos amigos, deixei o dinheiro em cima do teclado e fui ao banheiro. Na volta ainda deu pra ver a mão do Chicão pegando os trocados e agradecendo com polegar pra cima.
    Dormi feliz! Afinal, matara uma vontade que deve estar incomodando milhões de brasileiros, pois butecagem é um esporte nacional.
    Ontem, meu telefone tocou e eu atendi ao Profeta no viva voz:
  • Se prepare. Semana que vem tem mais e vai ser melhor. Tia Walkíria descobriu um boteco hologramático. Vai ser assim: nós viramos hologramas e vamos pra lá. Dizem que tem muita gente que já frequenta. Vai ser massa!
    Antes que eu respondesse, a Lúcia avisou que também vai:
  • Tem muita hologramazinha paqueradora por aí! Nesta, eu tô junto!
    Me senti orgulhoso pelo cuidado da patroa. Na próxima, eu conto como foi.
    Vicente Sá
    Novo PS: As Crônicas S/A, agora, estão sendo publicadas no portal – Central de Jornalismo – www.centraldejornalisamo.com.br e transmitidas pela Rádio Esplanada FM, todas as segundas feiras às 9 horas da manhã. Os leitores que quiserem ouvir minhas histórias pela minha voz devem acessar o site www.radioesplanadafm.org ou usar o aplicativo radiosnet.com. Até o próximo Domingo ou até amanhã

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Fonte Segura: Central de Jornalismo

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