Rachadinha não é crimezinho!

Por Mary Zaidan
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Central de Jornalismo

Delito assombra o presidente Jair Bolsonaro

A primeira obrigação é dar nome aos bois: rachadinha é um apelido simpático para desvio de dinheiro público, peculato no juridiquês. Em geral, a apropriação indébita de proventos de funcionários – fantasmas ou não – também está intimamente ligada à lavagem de dinheiro, esquema que o delinquente forçosamente cria para encobrir a origem da bufunfa garfada. Não raro, associa-se à organização criminosa devido à necessidade de estruturar e comandar redes azeitadas de coleta e de ocultação do delito.

O senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, e o primeiro-amigo Fabrício Queiroz foram denunciados pelos três crimes. O deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), candidato de Jair Bolsonaro à presidência da Câmara, deu mais sorte: além das acusações se limitarem a peculato e lavagem, ele foi presenteado com absolvição sumária. Não por ser inocente, mas pelo fato de as provas terem sido coletadas por instâncias superiores.

A decisão do juiz Carlos Henrique Pita Duarte, da 3.ª Vara Criminal de Maceió, que será contestada pelo Ministério Público Federal, é mais um daqueles absurdos que estimulam o crime e jogam no lixo a credibilidade da Justiça.

O caso de Lira se arrasta desde 2007, quando a Polícia Federal deflagrou a Operação Taturana, prendendo 36 políticos de Alagoas. Documentos obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo indicam que, entre 2001 e 2007, ele desviou mais de R$ 250 mil dos cofres públicos, tendo movimentado R$ 9,5 milhões em sua conta. Deputado estadual à época, Lira disputou e assumiu a cadeira de deputado federal, mesmo tendo sido condenado na esfera cível.

Lira e Flávio não são os únicos. A prática da rachadinha é quase endêmica. E como raramente é punida continua fazendo escola.

Na Assembleia do Rio, 42 dos 70 deputados são alvos de investigações. Não há um único estado em que o crime não apareça, a maioria deles impune ou com penas tão leves que compensam o crime.

Em São Paulo, fez-se um fuzuê com a rachadinha do ex-vereador Marquito, assistente de palco do Programa do Ratinho, em uma operação que envolveu prisões de 45 pessoas. O processo começou em 2016 e só neste ano a Justiça determinou a quebra de sigilo bancário dos suspeitos. Não se tem mais notícias também do caso da vereadora de Curitiba Fabiane Rosa (PSD) ou do vereador Léo Burguês (PSL), de Belo Horizonte.

Alguns acusados até foram condenados, sempre com delicadeza. O vereador Pablo Rocha Magela, de Cristalina, cidade na beirada do Distrito Federal, foi afastado de seu mandato. O ex-vereador Viana Patrick do Gás teve seus direitos políticos suspensos por 10 anos. O deputado estadual Eliene José de Lima (MS) chegou a ser apenado por 8 anos, mas em regime semiaberto.

Os exemplos se proliferam também no Executivo de pequenas cidades, como em Itaqui (RS), com pouco mais de 40 mil habitantes, na qual o esquema teria sido conduzido por funcionários graduados da Prefeitura, ou Caxambu do Sul (SC), onde o ex-prefeito Vilmar Foppa (MDB) é suspeito de comandar o reparte.

Assim como Flávio e Lira, há outros nomes de peso processados pelos mesmos crimes, a maior parte deles pela então procuradora-geral Raquel Dodge: Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que está preso, mas por outras falcatruas, Adalberto Cavalcanti (Avante-PE) e o senador Sérgio Petecão (PSD-AC), além de Érika Kokay (PT-DF), inocentada por prescrição.

As atenções do presidente Bolsonaro e do filhote estão voltadas para o STF, especificamente para o julgamento do deputado Silas Câmara (Republicanos-AM), cujo caso, ocorrido quando ele era deputado estadual, se assemelha ao de Flávio. Há uma semana, o ministro relator Luís Roberto Barroso votou pela condenação do parlamentar, sendo acompanhado por Edson Fachin. A sessão foi suspensa por um pedido de vistas de Nunes Marques, que tirou o processo do plenário virtual. O novíssimo ministro, ao contrário da independência que alegava possuir, tem sido fidelíssimo a Bolsonaro, aliviando, sempre que está ao seu alcance, a onda do padrinho.

Dita no diminutivo, rachadinha pode até parecer coisa de pouca monta. Mas é enriquecimento ilícito de engorda lenta e certeira. Sempre foi associada a parlamentares do baixo clero, clube frequentado por Bolsonaro por quase três décadas. Não tem o volume nem a sofisticação da rapinagem patrocinada pelo PT de Lula e seus asseclas, mas é roubo do mesmo jeito, até mais fácil de disfarçar. Os inexplicáveis R$ 6 milhões acumulados pelo clã Bolsonaro que o digam.

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Fonte Segura: Central de Jornalismo

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