Humor: A guerra às drogas, por Coronel Siqueira

‘Sugeri começar investigando a história do avião presidencial. 39 quilos de cocaína é muita coisa. Rolou um silêncio meio constrangedor’

Por Coronel Ciqueira
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Central de Jornalismo
10 de maio de 2021

Uma vez, há pouco tempo, me chamaram para uma reunião na polícia. Fiquei muito feliz. Além de rever os amigos de tantos anos, é sempre uma boa oportunidade de comer uma picanha e tomar um pouco de leite condensado.

Chegando lá, me sentei com o pessoal e escutei o que eles tinham a dizer. Um começou:

“O pessoal de cima tá reclamando que a gente não tá mostrando serviço. A população gosta, os programas sensacionalistas pedem, a gente tem que fazer alguma coisa…Algo que sempre vai bem é o combate ao tráfico. É claro que existem coisas muito mais importantes para a nossa sociedade, mas a imprensa gosta muito da guerra contra os traficantes, a gente sempre sai nos noticiários e tal. Temos que mostrar resultados pro povão ficar satisfeito! Alguém tem alguma ideia?”

Eu sugeri:

“Ué, podemos começar investigando aquela história do avião presidencial, o que vocês acham? 39 quilos de cocaína é muita coisa. E certamente o soldadinho que foi preso não agiu sozinho, né? Acho que ia dar uma boa história. Deve ter muito peixe grande aí. É muito mais inteligente prender os grandes chefes do que os aviõezinhos do tráfico. Com um bom serviço de inteligência a gente desmonta essa rede sem dar um tiro! Não precisa colocar policiais em risco, não precisa entrar em confronto com pequeno traficante, nada!”.

Rolou um silêncio meio constrangedor. Depois alguém discordou abertamente, deu um argumento genérico para explicar que isso não seria possível e todos concordaram. Como eu não estava ali para brigar, continuei tentando ajudar.

“Tem também aquele pessoal do Vivendas da Barra, né? Aquilo ali é um ninho de crime. Tem de tudo ali. Vocês viram que apreenderam 117 fuzis lá da última vez? Certamente é cabeça de alguma grande rede de distribuição, gente envolvida com milícias e tudo mais. Acho que se a gente conseguisse desmantelar esse esquema ia ser um golaço, ia aparecer no Fantástico e tudo. Se a gente corta a cabeça de uma organização dessas, o resto cai sozinho!”.

Mais uma negativa. Não entendi o porquê. Falaram que eram vizinhos de um conhecido, que era melhor não mexer com essa gente porque eram realmente perigosos e tinham penetração no Estado, falaram “do cara da casa de vidro” ou algo assim. Para mim, isso seria um ponto a favor, mas eles mudaram de assunto de novo. Continuei tentando ajudar:

“E aquele helicóptero com 500 quilos de pasta base que pertencia a um senador, heim? Até onde eu me lembro ninguém foi preso, como se a cocaína tivesse chegado lá sozinha! Vocês têm noção do preço de 500 quilos de pasta base de cocaína? Isso é coisa de milionário, esquema gigante, com helicóptero de senador e tal! Imagina se a gente resolve isso? Ia ser um tiro certeiro no tráfico organizado! A mídia ia enlouquecer! A gente ia ganhar prêmio internacional e tudo mais!”.

Me responderam:

“Ah, Siqueira, não sei. Acho questionável pois melindra alguém cujo apoio é importante”.

Outro continuou:

“Eh, mas temos que dar um jeito, a imprensa tá cobrando, temos que mostrar resultado. Não dá pra simplesmente deixar a coisa solta. Nem precisamos de realmente fazer algo que faça sentido, mas pelo menos temos que fingir que estamos fazendo. Temos que dar o gostinho do sangue para essas bestas-feras que estão soltas aí no Brasil… Mas o que fazer?”.

Todos se entreolharam. Aí o comandante parou, deu um suspiro, olhou em volta e respondeu:

“É… Não vai ter jeito. Vamos ter que invadir a favela de novo. Avisa a imprensa e manda o pessoal preparar o caveirão”.

Administrador

Fonte Segura: Central de Jornalismo

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