Crônica S/A-Uma cachaça de outro mundo

Por Vicente Sá
Central de Jornalismo
14 de março de 2021

Esta crônica se passa daqui a alguns meses, no futuro, portanto peço, como todo bom vate, um pouco de compreensão se alguns detalhes não ficarem bem claros ou totalmente compreensíveis. As imagens do que ainda está por vir são mesmo assim, imprecisas.
Estamos no final do ano 2022 e o Brasil, apesar da ineficiência do governo, está quase todo vacinado. Os encontros e pequenas aglomerações estão autorizados. Os bares, também, e, por conta disso, um amigo, Kleber Moraes, inaugura, na Asa Norte – tinha que ser na Norte –, o Bar do Outro Mundo. Nele, entre outras bebidas e petiscos, serve a famosa cachaça de Outro Mundo, razão do nome da casa.
Os extraterrestres – que são quase 15% da população asanortista – saudosos de seus mundos, são os primeiros a se tornarem fregueses do boteco e a experimentarem a propalada aguardente.
Alguns, após a segunda dose da bebida, passam a falar em suas línguas e ter visões dos prados e cidades onde nasceram. Cantam melodias extensas e de difícil acompanhamento, abraçam-se uns aos outros e alguns quase choram.
Nessas horas, a gerente, Clodiana, os aconselha a suspender a bebida e voltar ao gameshe, jogo muito popular no espaço sideral e que também é praticado com palitos de fósforos. Pode ser classificado como um tipo de porrinha interestelar.
O bar é cult e não há tvs, mas alguém comenta ao meu lado que as eleições foram vencidas por um partido de esquerda e que um senhor de barba grisalha é o novo presidente e que, exceto por uns poucos fanáticos do antigo governo, os brasileiros respiram mais aliviados e confiantes no futuro.
Mesmo sendo dezembro – mês de chuva – os dias amanhecem iluminados e alegres, e o bar do Outro Mundo é um sucesso de crítica e público.
Os mochileiros das galáxias, como os extraterrestes gostam de ser chamados – menos os venusianos que são uns chatos –, apelidaram a cachaça de Lunática e gostam tanto dela que vários deles chegam a enviar algumas garrafas para o seus planetas de origem.
A dita aguardente, que dá título à crônica, tem efeitos surpreendentes, também, nos terráqueos. Alguns reencontram parentes e amigos já desta vida idos, conversam e finalizam diálogos que criam perdidos.
Este cronista-vate que narra a história, tomou, certa feita, duas doses da coleção histórica e visualizou, ao seu lado, esperando um convite para sentar à sua mesa, ninguém menos que Getúlio Vargas, o pai dos pobres.
Gaúcho bom de papo tá ali. Estávamos em animada conversa, que iria noite adentro, quando o Profeta, que bebia na mesa ao lado, visualizou a figura de Carlos Lacerda e o convidou para sentar com ele. Ainda ressentido pela campanha feita contra ele por Lacerda no passado, Getúlio largou o charuto e partiu pra cima do ex-governador da Guanabara e, se não fosse a delicada, mas firme intervenção da gerente Clodiana, a coisa teria sido séria.
Acalmados os ânimos, ainda brindamos mais algumas vezes e os dois acabaram por esquecer as rusgas da política e chegaram a cantar juntos com Dircinha Batista, que também havia aparecido, a pedido de Getúlio, a música Chico Brito, antes de se despedirem.
Pois é isso, caros leitores. Ao sair do Bar do Outro Mundo, já de madrugada, um táxi parou na minha frente e eu, muito cansado e um tanto alcoolizado, entrei. O motorista já me conhecia e me trouxe de volta não só para casa como ao ano de 2021.
E encerro a crônica avisando que, infelizmente, as duas garrafas de Lunática que eu trazia para presentear os amigos e leitores, ficaram esquecidas no taxi. Assim, vocês vão ter que esperar até o ano que vem para conhecer os efeitos da danada.
Bom Domingo.

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