A academia está careca de saber pra quem vai o Oscar-Por Grace Maya

Central de Jornalismo
Por Grace Maya
26 de abril de 2021

Desde que vim estudar cinema em Buenos Aires, comecei a me preocupar em ver os filmes que concorrem ao Oscar, agora o povo pensa que eu devo ter alguma opinião e se apressam a me indicar filmes que gostaram muito e eu deveria ver. Quem me conhece bem sabe que vou acabar criticando algo e ficam esperando minha opinião, por curiosidade mesmo, imagino eu.

Já faz mais de 20 anos que não suporto nenhum filme que vai para o Oscar, todos me parecem, desde que comecei a refinar um pouco mais meu pensamento punk adolescente e burguês, ridículos e insuportáveis. Depois dos 26, quando fiquei viúva, foi definitivo,se tornou insuportável o romantismo cor de rosa hollywoodiano e comecei a perceber o ridículo desse maniqueísmo que impera em todos esses filmes.

Por sorte, estudando cine, encontrei todo um mundo desconhecido até então de filmes excelentes, que foram produzidos até a década de 70 em geral, muitos com êxito comercial, mas bem diferente do comercial de hoje. Pude voltar a desfrutar dessa arte, que já me tinha desesperançada. Por isso, posso afirmar com algo de certeza que esses filmes de hoje são todos um lixo, sem exceções. E me dá muita pena que a maioria das pessoas se contentam com Netflix e perdem o melhor da festa.

A academia está “careca dourada” de saber que o cinema é a arte mais cara para se produzir, e desde a guerra das patentes, sabemos nós também, que ali se faz dinheiro! O cinema é a sétima indústria nos isteitis e mesmo com todas as mudanças que levaram os cinemas de verdade a virarem igrejas e os filmes começarem a ser vendidos nos shoppings, essa arte, ainda tão nova, se sustenta com força. O cinema, que em seus inícios, era um espetáculo para as massas operárias, se tornou cada vez mais burguês, de burgueses, para burgueses, uma grande passada de mão na cabeça da classe mais importante para a perpetuação do capitalismo.

Já dizia Glauber que o cinema servia às necessidades burguesas, a estética da fome, nada mais é que esse fetishe burguês de se sentir bem quando se preocupa com os pobres e se orgulha de ver a natureza, a fome, os povos originários …como se fosse um passado comum da humanidade, gerando uma nostalgia de algo que nunca foi.

A hermenêutica burguesa servida com todo o glamour do tapete vermelho e flashes, reitera a decadência de nossa sociedade,cada vez mais infantil, facista e idiotizada, incapaz de produzir e! “consumir” algo fora do quadradinho. Tudo que é diferente é cancelado imediatamente e ninguém se dá o trabalho de pensar nossas formas, novas linhas de fuga, novos pensares, e esses filmes não me deixam mentir. Pior, negam o passado! Se diz que as películas antigas não são tão legais!

Bom, primeiro que não existem películas antigas, o cinema não tem nem 200 anos, por esse critério jogamos Da Vinci na lixeira! Segundo, os filmes que dizem ser antigos, possuem tudo que o cine contemporâneo possui, com muito mais qualidade e originalidade. Quem proclama esse tipo de coisa, fala de um lugar de ignorância e de certeza típica dos tempos fascistas que vivemos.

Mas vamos lá, vou dar um un passand en cada película, desde um lugar de espectadora, e jamais de crítica, por favor entendam

Homeland é uma atualização americanizada dessa estética da fome, apesar de ser dirigido por uma mulher, como todas as outras películas que são dirigidas por mulheres que estão no Oscar, não logra trabalhar um ponto de vista diferente da hegemonia. Romantiza a fome e a vida na natureza em uma saga de intenções intelectuais, que enche os estômagos da esquerda burguesa, que podem intelectualizar esse filme, e se sentirem boas pessoas ao se solidarizarem com a telona. Essa mulher que consegue comer quando trabalha pros fdp da Amazon, e por sorte não é estuprada em cada esquina que para seu trailer, não sentaria na mesa de quem gosta desse filme. Os intelectuais que gostam desse tipo filme, achando que é bom porque é lento, estão jogando no lixo os escritos de Deleuze onde ele advertia sobre o complô dos tópicos no cinema.Um clichê completo, lugar comum e narrativa previsível e claro aquela atriz que se aprende a gostar, apesar de não ser bonita, e isso nos faz se sentir bem, não somos tão nazi ao final.

Judas e Black messiah, um logro absurdo conseguir fazer um filme sobre Os Panteras Negras e ser ridículo ao mesmo tempo. Nostalgia dos 70 para fazer o sonho da revolução ser coisa do passado e convencer a todos que ao final tudo segue como devia ser. De forma bem sutil, tudo é destruído diante de nossos olhos, vejo um negro traidor como protagonista, e um policial ultra branco quase legal e honesto. Vejo o líder dos panteras negras terminando como um loooser que morre dormindo e deixa sua princesa sonhadora com um filho na barriga, tudo banalizado em torno desse romance.Não me digam que isso era filme para exaltar os panteras negras, a breguice, a música melódica, tudo leva a uma destruição da imagem de um dos mais fortes movimento antihegemonico do planeta, um filme para negros burgueses e um banquete para nazi facistas.

Outro filme sobre a mesma época, por coincidência pensa um desavisado, que coloca os chefe dos panteras negras também humilhado e com direito ao final feliz depois que termina o filme. Paralelamente exalta o branco traidor, a polícia assassina e o procurador que termina o filme se levantando para estar ao lado dos hippies que não conseguiram matar, depois de um processo kafkiano e patético, que por sua vez, nunca condena os verdadeiros culpados por esse massacre. Em forma de texto, depois do final, me dizem que deu tudo certo. Mas o pior é que foi engraçado e divertido, tudo em diálogos rápidos, geniais, como Netflix sabe bem fazer! Eram tantas caras conhecidas que até esquecemos que é um filme, algumas tomas de documentário para dar veracidade, e sempre um monte de gente vestindo azul, a cor do Netflix, uma merda muito bem feita que acabei vendo inteira e rindo bastante, super atuações, e confesso, pra que não digam que não sou humana, até me emocionei ao final, mesmo sabendo que era um final perverso.

O outro filme,que também é dirigido por uma mulher, mas que fica muito a desejar, é o filme da vingadora serial killer que mata machos por vingança. Quem me conhece sabe que adoro o tema da vingança, mas não consegui ver o filme. Esse sotaque de sofrência burguesa junto com estética Barrados no Baile e os diálogos superficiais dessa galerinha branca burguesa, que chega a ser infantil e nada verossímel, não me desce, sorry, valeu a intenção, mas como mulher, podemos tratar o tema como menos neon e mais realidade. A loira tutty-frutti é apenas mais uma gostosa que os machos de plantão vão gostar de ver na telona e em nenhum momento se sentiram ameaçados, pelo contrário, outro fetishe muito comum, servido de banquete.

Mank, outro filme que tinha tudo para ser decente e não chega a ser digno de um Oscar é esse sobre o roteirista do Orson Welles, por dios! Que afronta esse filme, banaliza e romantiza tudo em direção a diminuir a genialidade do gênio, que o cinema atual está tratando de destruir, cada vez menos as pessoas são capazes de assistir um filme como Cidadão Kane e outra vez servimos um banquete para os intelectuais falarem do mestre de forma trivial e seguirem com esses filmes de roteiro estilo Mckee. Óbvio que escolherem bem o ator e o preto e branco fica lindo sempre. Deixo a dica para verem os filmes de seu irmão, Joseph Mankiewicz,são excelentes.

Agora vocês me matam! O padre, com Anthony Hopkins! Outra punheta burguesa! Bom , se você quer cagar um filme, coloca um ator desses como protagonista, não importa nada, o Anthony é amado por todos, não se vê o filme! Não sei porque merda agora acham que somente falar de assuntos importantes, como doenças, já está, é um filmaço, qualquer assunto é importante, mas a forma que se mostra é que é importante entender. O capitalismo odeia velhos, odeia pessoas que não sejam úteis a seu ideal liberal: o lucro! Então, não me digam que os burgueses gostam de ver um velho que não serve para nada na telona, pura hipocrisia. O filme tem um pouco de jogo na montagem, que quem assiste a séries já está acostumado, não seria nada novo, e de resto nada, o Anthony sustenta tudo que poderia ter ficado no teatro onde teria muito mais valor.

Outro filme estilo sessão da tarde, que entra pra lista, provavelmente pelo mesmo motivo: falar sobre doenças de forma romantizada e com melodrama barato, é o O som do metal. Feito para as pessoas verem em suas casas a agradecerem a deus por sua saúde e voltarem a trabalhar calados na segunda, o filme do baterista que fica surdo é muito pobre na tentativa de jogar com a subjetividade do som, as atuações são mais que desejáveis e o resto não tem nada, além de falar sobre a surdez, de forma a não incomodar muito. Aliás esse tema também aparece em um outro filme estrangeiro, ou seja, vemos a linguagem inclusiva sendo normalizada para neutralizar o discurso das feministas.

O que ficou claro é que desde seu início o cinema é a principal arma do facismo, nem Mussolini, nem Hitler teriam sido o que foram sem o cine, ah nem Perón! Getúlio que não usou bem, e disse pra Perón em uma carta que não curtia a ideia, desapareceu da conversa. O cinema, desde cedo, soube colocar em movimento, em forma de historinhas, ideologias que favoreciam a nova burguesia, os novos milionários e suas ideias platônicas. A verdade e os valores ideias em uma narrativa linear que tudo se justifica em uma polaridade e simplismo que convém à igreja, ao estado e às aristocracias de sempre.

A academia, em sentido lato sensu, é um lugar de perpetuação da hegemonia, a hegemonia que controla o conhecimento, a produção de saber, e a tal da verdade. Nada melhor que um boa historinha para convencer alguém de algo, diga-se de passagem a bíblia é o livro mais vendido no mundo, e não é um livro de teorias quânticas, nem de lógica, é um livro que conta historinhas, com começo, meio e fim e tal da moral da história.

A moral da história é a finalidade, é a premissa que exige a academia, e deve estar de acordo com o marco teórico e moral da comunidade. Sim é assim, eles podem querer disfarçar, mas todos os filmes que passam nas mãos desses, que se deixam chamar de críticos, os famosos cagadores de regras, não são mais que uma moral da história para vender para o povo seguir inerte e cada vez mais submisso.

O desejo burguês, o desejo que a burguesia acredita ser dela, e dizem com orgulho com seu sotaque ignorante “Eu quero, eu gosto, eu sou assim, eu sou assado,eu quero ver tal filme, eu não gosto de tal filme ….” toda essa opiniãozinha não nasce em suas cabeças vazias, como pensam, nasce nas mesas das grandes corporações. E seguindo as estrelinhas, postas por esses críticos bem pagos para dizer que essa historinha é boa, a burguesia alimenta o imaginário que governa o capitalismo neoliberal. Essa opiniãozinha sobre esses filmes é um sintoma de algo bem grave, a falta de um pensamento crítico e a falta de liberdade!

O povo manso habituado a autoridade real não suporta a liberdade, amam suas correntes e os burgueses se alimentam da repressão desse sistema, que em cada grama de farinha e torrões de açúcar sangra nossa sociedade, e ao final, essa pipoca nunca é servida para o santo, serve apenas ao sistema opressor.

Seguimos mais uma semana, nos acostumando com o número de mortes, e comentando o vestido lindo da diva e dizendo, me gusta, no me gusta,me gusta, no me gusta… enquanto destapamos el malbec! Cheers hermanos!

Grace Maya
Buenos Aires 2021

Desejo a vocês uma linda semana!
Se cuidem, se vacinem, se aloguem …
Bjinhos!

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